Sob a justificativa de urgência para simplificar, tornar mais justa e eficiente a ordem tributária, promulgou-se em 21 de dezembro de 2023, com rapidez jamais vista entre aprovação e promulgação, a Emenda à Constituição nº 132, que promove uma série de alterações, principalmente na tributação dos bens consumo e serviços.
Apesar de concordar com a incontestável necessidade de reformulação do modelo fiscal e tributário brasileiro, em nome do lobby político e outros interesses, que vão além do que nos é apresentado, a Câmara dos Deputados no meu ponto de vista age precipitadamente, pois acelerou a tramitação de uma matéria que exigia maturação e ponderação, especialmente em decisões de grande impacto político, social e econômico, privilegiando a velocidade em detrimento da precisão, abrindo espaço para que a nova política fiscal e tributária possa nascer com distorções significativas.
Entre outras mudanças, a EC nº 132 traz a criação da Contribuição de Bens e Serviços (CBS), substituindo as contribuições para o PIS e a COFINS, bem como a instituição do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que substitui e unifica o ICMS e o ISS, sendo que esses dois novos tributos teriam os mesmos contribuintes e base e cálculo, incidindo amplamente sobre operações com bens e serviços.
Em uma primeira análise, a criação da CBS não me parece implicar em uma mudança substancial na carga tributária das empresas hoje optantes pelo Lucro Real. Estima-se, inicialmente, que sua alíquota seja em torno de 9,5%, enquanto as alíquotas do PIS e da COFINS são de 9,25% (regime não cumulativo). No entanto, quando falamos das empresas hoje tributadas pelo Lucro Presumido que as alíquotas são de 3,65% (regime cumulativo), substancialmente temos um reflexo de aumento de 160%, que adicionada a criação do IBS, devido a seus efeitos em circunstâncias específicas, revela um cenário preocupante aos prestadores de serviços.
O IBS terá uma alíquota uniforme, independentemente da situação econômica do contribuinte. Ou seja, o prestador de serviço e o comerciante estariam sujeitos à mesma carga tributária, equiparando as duas atividades para efeitos de cobrança deste tributo. Então, com uma alíquota-padrão estimada em cerca de 18%, o imposto, em princípio, adotaria um abrangente sistema de não cumulatividade, o contribuinte teria o direito de abater do IBS devido nas operações anteriores, como crédito referente ao imposto incidente sobre os bens e serviços adquiridos.
Logo para o prestador de serviços temos a segunda “porrada”, atualmente sujeito a uma alíquota de ISS que varia de 2% a 5% sobre o valor da prestação, passará a ter uma tributação de 18%, ou seja, pelo menos no melhor cenário de 260% a mais. Apesar do IBS ser não cumulativo, sua alíquota seria consideravelmente superior à do ISS, além disso, o setor de serviços, diferentemente do comércio, tende a ter menos insumos, resultando em um crédito de IBS para abater do imposto devido.
Mesmo que a EC nº 132 traga previsões de redução da alíquota para alguns segmentos de serviços em percentuais que chegam 60%, muitos outros segmentos serão significativamente afetados, imaginemos uma empresa de desenvolvimento de software ou mesmo uma agencia de publicidade, cujos insumos se limitam a mão de obra, material de papelaria, servidores, internet e softwares, a situação é desafiadora.
No contexto do IBS, o elemento humano que desempenha o trabalho, contratado com vínculo empregatício, não geraria direito a créditos fiscais, uma vez que o imposto em questão não incide sobre as relações de emprego.Diante desse panorama, ao analisar especificamente o IBS para o setor de serviços, seria mais vantajoso, em vez de contratar empregados e criar postos de trabalho, optar pela contratação de mão de obra terceirizada sob a forma de pessoa jurídica. Isso reduziria os encargos trabalhistas, já que o IBS cobrado sobre a prestação de serviço poderia ser utilizado para abater o imposto devido.
Como ficariam as fiscalizações do Ministério do Trabalho?
Vejo que a intenção da reforma em promover simplificação e justiça tributária, ocasionou um problema muito grande para o setor de serviços do país, principalmente no que diz respeito a criação do IBS no formato em que foi proposto, pois além de resultar em um aumento significativo na carga tributária, que certamente será repassado ao consumidor por meio do aumento dos preços, prejudicando a sua contratação, em especial as pessoas de menor renda, ainda pode enfraquecer as relações empregatícias.
Aguardemos cenas dos próximos capítulos.